Nesta semana prevê-se a votação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado do projeto de lei n. 436 de 2016 do Senador Antônio Anastasia (MG), que propõe a alteração do art. 7º da Lei Anticorrupção nº 12.846, de 01/08/2013, para exigir a certificação de gestor de sistema de integridade como condição para atenuar sanções administrativas.
TEXTO DO PL 435/16
O texto prevê que o art. 7º da Lei nº 12.846/13 passe a vigorar com a seguinte redação, renomeando-se o atual parágrafo único (que dispõe sobre o regulamento para os parâmetros de avaliação de mecanismos e procedimentos previstos no inciso VIII) como § 1º:
“Art. 7º ……………. (Serão levados em consideração na aplicação das sanções: – repetimos o texto do art 7º)
………………………………………………………………………………………
VIII – a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica, certificados por gestor de sistema de integridade devidamente preparado para a função (grifo nosso);
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§ 1º ……………………………………………………………………………….
§ 2º São funções básicas do gestor de sistemas de integridade:
I – gerir de forma autônoma os mecanismos e procedimentos do inciso VIII do caput, contribuindo para seu aperfeiçoamento contínuo;
II – atuar de forma constante e engajada nas interações entre a pessoa jurídica e as autoridades públicas;
III – manter de forma atualizada e disponível a documentação relevante ao cumprimento do inciso VIII do caput.”
JUSTIFICATIVA
O autor do PL justifica o texto pela crescente importância da gestão de integridade/compliance, ressaltando os benefícios de um sistema de gestão de integridade, mas reconhecendo que o ritmo de sua implantação nas empresas “prossegue com certa lentidão”. Ele ainda argumenta que se pode entender como de natureza mais concreta e efetiva a indicação de um gestor deste sistema, seja funcionário ou terceiro contratado, com funções mínimas definidas por lei, o que já demonstraria um nível de comprometimento da alta direção da empresa em estruturar um sistema de integridade.
ANÁLISE DO PL 435/16 E DA JUSTIFICATIVA
A função referenciada no PL tem uma certa similaridade com a Unidade de Gestão de Integridade do setor público, que deve ter competência para: coordenação da estruturação, execução e monitoramento do programa; orientação e treinamento dos servidores com relação aos temas atinentes; e promoção de outras ações relacionadas à implementação dos planos de integridade, em conjunto com as demais unidades do órgão ou entidade.
Também alinha-se totalmente ao Compliance Officer já consagrado no mercado.
Quanto ao ritmo de implantação do sistema de integridade nas empresas, vale lembrar que o PL é de 2016, e o autor usa pesquisa de 2015 para basear esta afirmação. Creio que houve um crescimento das implantações de sistemas de gestão de integridade/compliance/antissuborno no Brasil de lá para cá, o que é incentivado também pelas certificações ISO 37001 e ISO 19600, mas ainda há um grande caminho a percorrer.
O texto define funções mínimas deste “gestor de sistema de integridade”, de forma genérica, o que deve ser determinado em regulamento.
Como referência, a Norma ISO 37001 define as funções gerais da “função compliance antissuborno” em seu item 5.3.2, mas complementa estas responsabilidades em outros pontos desta norma, além de uma orientação mais detalhada em seu Anexo A.6. A norma de diretrizes ISO 19600, por sua vez, define mais detalhadamente as atribuições e responsabilidades da função (ou gestor de) compliance em seus itens 5.3.1 e 5.3.4. Vale comentar que a organização não necessitaria obrigatoriamente de um profissional dedicado totalmente ao sistema de gestão, mas que esta função pode ser compartilhada com outras funções dentro da Organização.
Interessante ressaltar nas duas normas ISO a necessidade de provisão de recursos e de competência, posição, autoridade e independência apropriadas desta função, com acesso direto e imediato ao Órgão Diretivo (se existir) e à Alta Direção. O PL referencia apenas que o “gestor de sistema de integridade” deve gerir de forma autônoma este sistema. Os três textos expressam que este profissional pode ser funcionário da organização, ou um terceiro contratado.
Nenhum dos textos define os parâmetros e competências requeridas para a “devida preparação para a função” deste profissional. Certamente as competências requeridas dependem de uma série de fatores, p.ex. tamanho e grau de complexidade da organização, riscos envolvidos. Apesar desta definição de competências ser mais afeta à seara dos conselhos profissionais, regulamentação das profissões e certificação profissional, a lacuna nesta definição mantém na prática o risco de nomeação de profissionais de integridade não competentes para esta função. Este é um assunto que merece discussão ampla sobre os critérios, não somente por conta da Lei Anticorrupção.
Critérios legais que ajudem a elevar os requisitos de integridade/compliance sempre são bem-vindos! Mas devemos avaliar a sua efetividade diante dos riscos envolvidos. Como é de praxe em toda boa decisão, e levando em conta as boas práticas e bom senso na gestão de compliance!
Michel Epelbaum – Diretor da Ellux Consultoria
Diretor da Ellux Consultoria. Tem mais de 25 anos de experiência nacional e internacional em gestão de sustentabilidade, qualidade, meio ambiente, saúde ocupacional e segurança, e compliance. É membro dos Comitês Técnicos da ABNT de Gestão Ambiental, Antissuborno, Riscos, Governança, Responsabilidade Social e Energia. É Lead Assessor nas normas ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001, ISO 45001, ISO 19600 e ISO 37001.
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