Como já comentado em artigo anterior, a Lei Anticorrupção 12.846/13 foi regulamentada apenas em alguns estados e municípios (dentre os quais o Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná, São Paulo, Tocantins e Rio de Janeiro, e 10 municípios), ampliada com a exigência de Programa de Integridade para contratos com a Administração Pública em alguns deles, estando ainda em início de implementação Há muito ainda a avançar nesta regulamentação, mas prevê-se que este processo ora em andamento leve a um aumento do grau de exigência nos processos licitatórios e no relacionamento geral com o setor público, visando evitar atos ilícitos de corrupção.
Já percebo sinais desta demanda de estruturação, gestão e requisitos de qualificação, seja por consultas de organizações privadas ou públicas, pequenas, médias ou grandes empresas, de vários setores, e também de requisitos de integridade para qualificação e contratação da minha própria empresa.
Recentemente recebi mais uma demanda de proposta de serviços para a implementação da ISO 19600/ISO 37001, desta vez com motivação também baseada na Lei 6.112 do Distrito Federal, de 02/02/2018 (publicado no Diário Oficial em 06/02/2018), que dispõe sobre a obrigatoriedade da implantação do Programa de Integridade nas empresas que contratarem com a Administração Pública do Distrito Federal, em todas as esferas de Poder. Nesta lei é definido o modelo de Programa de Integridade e a forma de sua avaliação, baseada na Lei Anticorrupção federal e seu Decreto regulamentador n. 8.420/15, bem como no Decreto DF 37.296/16 (que disciplina a aplicação da Lei nº 12.846/2013 no DF), com implantação prevista a partir de 01/06/2019, e a definição de multa diária de 0,1% do valor do contrato (até o máximo de 10% do seu valor), além de outras punições em caso de descumprimento.
Neste artigo chamo a atenção para o processo de avaliação de atendimento a este Programa de Integridade: a Lei DF 6.112/98 define que a pessoa jurídica deve apresentar relatórios de perfil e de conformidade do Programa (alinhado ao Decreto DF 37.296/16 e à Portaria CGU 909/15), com evidências, a serem avaliados pelo gestor (ou fiscal em caso de não haver esta função) de contrato. A Lei 7.753/2017 do Rio de Janeiro, também prevê a avaliação do Programa de Integridade pelo gestor do contrato.
Questões sobre a avaliação do Programa de Integridade
Elogiando o objetivo da iniciativa, não podemos deixar de questionar a potencial eficácia do processo implementado para atingir este objetivo. E aí, não somente no caso do Distrito Federal, sugere-se considerar algumas questões para discussão quanto à implementação e forma de avaliação do Programa de Integridade, para atingir seus objetivos pretendidos:
Será que os gestores/fiscais de contrato são as autoridades adequadas para avaliar o Programa de Integridade da pessoa jurídica, uma vez que são partes envolvidas e interessadas no processo de contratação/supervisão, podendo ser questionada a sua independência?
Qual a competência requerida e a existente dos gestores/fiscais de contrato para poderem avaliar adequadamente o Programa de Integridade da pessoa jurídica?
Quais os critérios mínimos de aceitação de cada elemento do Programa de Integridade para serem aprovados?
Quais evidências solicitar para poder atestar a efetiva implementação do Programa de Integridade, e sua eficácia em reduzir os riscos específicos da pessoa jurídica e do contrato envolvidos?
Que tempo de implantação é razoável aceitar para considerar o Programa de Integridade eficaz?
Em que casos os gestores/fiscais de contrato deverão solicitar entrevistas com o pessoal da pessoa jurídica envolvida? Com quem deverão falar?
Após a qualificação inicial do Programa de Integridade da pessoa jurídica, qual a sistemática periódica para avaliar se ele continua implementado eficazmente?
Será que o Programa de Integridade definido pela Lei Anticorrupção e seus regulamentos não deveriam contemplar explicitamente como parâmetro a auditoria/ avaliação independente como ferramenta de avaliação (além do monitoramento contínuo já previsto)?
Avaliação do Programa de Integridade
A avaliação do programa de integridade e sua independência é ponto fundamental em diversos modelos de gestão de compliance e antissuborno, tais como o Global Compact da ONU, o FCPA dos EUA, o Pró-Ética da CGU e as normas adotadas pela ISO ou nelas baseadas de Sistemas de Gestão Antissuborno (ISO 37001) e de Compliance (ISO 19600, a futura NBR 19601 ora em consulta nacional na ABNT; e DSC 10000). E no caso dos modelos da ISO, existe ainda a verificação externa, constituída através dos critérios de certificação definidos usualmente pelos representantes governamentais dos países (no caso do Brasil é o INMETRO, p.ex. para a Norma ISO 37001, e espera-se que este esquema seja criado para a futura norma brasileira NBR 19601) ou independentes (como no caso da DSC 10000, com certificação acreditada pela ONG EBANC). Neste sentido, as Normas da ISO e o esquema de certificação governamental para as mesmas pode ser um exemplo de boas práticas no que tange aos elementos do programa de integridade e sua avaliação, de modo a aumentar a eficácia da Lei Anticorrupção e suas regulamentações
Vale comentar ainda a tramitação do Projeto de Lei do Senado n° 435, de 2016, de Autoria do Senador Antonio Anastasia (PSDB/MG), que propõe alterar o art. 7º da Lei nº 12.846/13, para exigir a certificação de gestor de sistema de integridade como condição para atenuar sanções administrativas, de modo a condicionar a eventual avaliação de programa de compliance de uma empresa para fins de aplicação das sanções da referida Lei à existência de um gestor independente que efetivamente possa certificar seu funcionamento correto. No entanto, a determinação da competência e requisitos deste gestor não são completamente esgotadas no documento, dando margem a mais discussões quanto aos critérios para esta certificação, que não existe atualmente.
Conclusões
É possível perceber um movimento de alta na implementação de programas/sistemas de gestão de compliance/integridade nas organizações, impulsionado pela Lei Anticorrupção e seus regulamentos nas várias instâncias, mas também por modelos internacionais legais ou de entidades normativas de boas práticas. Considerando a profusão de modelos existentes para este programa, merecem reflexão os parâmetros de aceitação do mesmo, como ele será avaliado e a independência desta avaliação, visando a um objetivo comum a todos os modelos adotados: a eficácia na redução de riscos de atos ilícitos de compliance (incluindo o suborno).
Michel Epelbaum – diretor da Ellux Consultoria
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