O gerenciamento ambiental na indústria: um aval para a certificação ambiental – 1993
Artigo publicado e apresentado no 17o. Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental – 1993
Autores: Michel Epelbaum e Jair Rosa Claudio
RESUMO
Nos últimos anos, novos conceitos em proteção ambiental têm-se incorporado ao gerenciamento empresarial, parte por consciência das responsabilidades da organização, parte por pressões estatutárias e do mercado consumidor. O Artigo aborda um destes conceitos, a e certificação ambiental. Define e explica as diferentes concepções de certificação. Discute a estrutura organizacional e operacional do sistema de certificação na Comunidade Européia e no Brasil.
Finalmente aponta tendências da certificação ambiental na Comunidade Européia e Brasil.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos pode-se observar transformações significativas nos métodos de gerenciamento empresarial, com vistas à manutenção da competitividade das empresas. Procurando melhorias em todas as características finais de interesse ao consumidor em seus produtos, as empresas vêm modificando sua estrutura produtiva de modo a reduzir custos e preço final, aperfeiçoar o seu sistema de garantia da qualidade de processos, produtos e serviços ao consumidor, aumentar a produtividade e garantir a proteção ambiental na produção, entre outros.
Novos conceitos e teorias em gerenciamento empresarial surgiram, como a teoria da qualidade. E seja pela pressão de mercado ou pelo aumento da consciência da responsabilidade do setor produtivo pela proteção do ambiente e saúde do homem, novos conceitos surgiram em gerenciamento ambiental, incorporando-o progressivamente à estratégia empresarial e aos custos de produção.
Entre eles, pode-se citar a atuação responsável (“responsible care”), o desenvolvimento sustentado e a certificação ambiental.
Neste artigo, é abordada a certificação ambiental, a nível de conceituação, estrutura e peracionalidade na Europa, e tendências no Brasil.
2. CONCEITUAÇÃO
De acordo com a norma ISO 8402, qualidade é a totalidade de aspectos e características de um produto ou serviço que o torna capaz de satisfazer necessidades expressas ou implícitas.
Neste sentido, pode-se entender a certificação Ambiental como urna necessidade expressa do consumidor de saber que o produto que está adquirindo foi fabricado em instalações que não causam danos ao ambiente, a empresa fabricante não utiliza matérias primas extraídas em condições de dano ao ambiente e que o próprio produto não seja nocivo à saúde e ao ambiente.
De acordo com este raciocínio, proteção ambiental é uma qualidade desejada no produto e a certificação ambiental é a
garantia da qualidade deste produto para o consumidor.
Pode-se definir certificação como:
“Atestado de conformidade de um produto, processo, sistema ou serviço com um referencial”.
O referencial é um conjunto de exigências, normas técnicas, legislações ou instruções emitidas por autoridades
governamentais, comissões ou por empresas.
Com relação ao objeto, a certificação pode ser de:
· produtos;
· processos ou sistemas.
Com relação à origem da exigência, a certificação pode ser:
Regulamentar, realizada de acordo com as normas e legislações oficiais, como as diretrizes da comunidade européia,
visando a obtenção do selo CE;
Voluntária, realizada por organismos acreditados e autorizados junto a governos, visando a obtenção do selo autônomo.
Os objetivos da certificação são:
Diferenciar produtos, processos, sistemas ou serviços através de um selo ou certificado internacional aceito;
Provar que é verdadeiro o que se diz do produto, processo, sistema ou serviço.
3. CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL NA EUROPA
A estrutura para certificação na Europa encontra-se atualmente bastante desenvolvida, sendo ilustrada na fig. 1
As principais normas européias para acreditação e certificação são:
EN 45001 – “General criteria for the operation of testing laboratories” (critérios gerais para a operação de laboratórios de
testes);
EN 45002 – “General criteria for the assessment of testing laboratories” (critérios gerais para a avaliação de laboratórios de
testes);
EN 45003 – “General criteria for laboratory accreditation bodies” (critérios gerais para organismos de acreditação de
laboratórios);
EN 45011 – “General criteria for certification bodies operating product certification” (critérios gerais para organismos
certificadores de produtos);
EN 45012 – “General criteria certification bodies operating quality system certification” (critérios gerais para certificadores
de sistemas de qualidade);
EN 45013 – “General criteria for certification bodies operating certification of personnel” (critérios geais para
organismos certificadores de pessoal);
EN 45014 – “General criteria for suppliers declaration of conformity” (critérios gerais para a declaração de conformidade
de fornecedores).
À certificação regulamentar na Europa é realizada segundo as diretrizes, através de organismos qualificados, visando a
obtenção do selo CE.
Essas diretrizes não fazem referência a normas, na medida em que não será criado um sistema europeu de certificação. Elas
são instruções de harmonização técnica que se constituem em exigências essenciais, às quais os produtos devem obedecer.
Os sistemas nacionais de ensaios, certificação e inspeção serão utilizados, adaptados e desenvolvidos.
À diretriz européia relativa à certificação ambiental de produtos é o Regulamento (CEE) n2 880/92, que institui o “ECOLABEL”.
3.1. Certificação de Produtos: o “ECO-LABEL”
– Definição e Objetivos
Este instrumento institui um sistema comunitário de concessão de selo ecológico (“ECO LABEL”) aplicável a produtos em
geral com exceção de gêneros alimentícios bebidas e produtos farmacêuticos. Este sistema visa:
garantir o mínimo de impactos ambientais em todo o ciclo de vida de um produto, desde a sua concepção até o seu
descarte final;
melhor informar os consumidores sobre os impactos ambientais causados pelo produto.
– O Sistema de Atribuição do “ECO LABEL”
O selo ecológico só será atribuído a urna categoria de produto cujo ciclo de vida esteja coerente com as normas da
Comunidade Européia de saúde, segurança e meio ambiente. Em principio não será atribuído a produtos oriundo de matérias
primas classificadas como perigosas, salvo demonstração que estas, após as transformações do processo industrial, não
causem danos a consumidores e ao meio ambiente.
Os produtos importados pela Comunidade Européia passíveis de atribuição do selo ecológico, deverão respeitar os mesmos
critérios de rigor em sua produção que aqueles produzidos dentro da Comunidade. A Comissão Européia atribui a cada
Estado membro a designação de organismos competentes para análise dos pedidos de concessão do Selo Ecológico. Cabe
à Comissão, entretanto, a fixação dos critérios gerais de análise. Basicamente, cada pedido deverá ser acompanhado de
uma matriz de avaliação de impactos ambientais (ver figo 2), cujo modelo é definido pela Comissão Européia. Tais matrizes
contemplam desde a extração/produção das matérias primas, até a embalagem e forma de comercialização do produto
acabado. Os critérios de análise de cada categoria de produto tem validade por prazo determinado, geralmente em torno de 3
anos.
Os diversos organismos nacionais competentes, deverão consultar os grupos de interesse afeitos à atribuição do selo
ecológico de uma determinada categoria de produto. Entre os setores a serem consultados estão, normalmente,
representantes do setor industrial específico, do comércio, dos órgãos de defesa dos consumidores e das organizações
ambientalistas.
Após a análise técnica do produto e a consulta aos setores envolvidos, o organismo nacional envia os resultados do processo
à Comissão Européia que decide pela concessão ou não do selo.
O selo é atribuído por categoria de produto e por período geralmente, não superior a 3 anos, e nunca superior ao da validade
do critério de atribuição ambos, porém, passíveis de prorrogação.
Uma vez concedido pela Comissão Européia o Selo Ecológico para uma categoria de produto, cabe aos organismos
competentes nacionais a decisão da atribuição do mesmo para cada marca específica de produto dessa categoria.
Todo o processo de análise dos pedidos é protegido por regras severas de confidencialidade, ficando restrita ao interessado,
por exemplo, a informação sobre a eventual rejeição de um pedido. Todavia os pedidos aos quais são atribuídos o SE, têm
ampla divulgação pela própria Comissão Européia.
– O Selo
O Selo consiste-se de um logotipo padrão, com validade específica, que poderá ser usado pelo fabricante.
Critérios rígidos, todavia, estabelecem os limites da utilização do mesmo em caráter de publicidade.
3.2. Certificação de Sistemas de Gerenciamento Ambienta!
Paralelamente à certificação ambientaI de produtos, um outro conceito em fase de implementação na Comunidade Européia é a
certificação de sistemas de gerenciamento ambientaI. Os princípios dessa modalidade de certificação são expressas na
norma inglesa BS 7750 “Specification for Environmental Management Systems”.
Baseada na Teoria da Qualidade, esta norma fornece um modelo e requisitos para o estabelecimento de sistemas de
gerenciamento ambientaI, contendo ligações com o documento em discussão sobre a regulamentação de auditorias
ambientais na Comunidade Européia (versão 3, dezembroj91).
Os elementos e requisitos do sistema de gerenciamento são ilustrados na fig. 2.
A norma BS 7750 tem por objetivo fornecer um modelo para certificação de sistemas de gerenciamento ambiental. Esta se
daria da mesma forma que com sistemas de garantia de qualidade, através de organismos que atendam à norma EN 45012.
A certificação de sistemas de gerenciamento ambiental não se trata de uma forma alternativa do “ECO LABEL”, mas sim de
um instrumento para a sua obtenção. Isto porque os elementos a serem avaliados e pontuados para a concessão do selo
estão inclusos naqueles administrados pelo sistema de gerenciamento ambiental: os requisitos de emissões, consumo de
recursos naturais ou padrões no produto podem ser estabelecidos como metas a serem atingidas dentro do sistema.
Portanto, pode-se afirmar que o sistema de gerenciamento ambiental é um dos passos efetivos também para a certificação
ambiental de produtos.
4. PERSPECTIVAS DA CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL
Os efeitos das iniciativas de certificação ambiental já tem extrapolado, em muito, as fronteiras do Mercado Comum Europeu.
Embora o Selo Ecológico tenha validade apenas na Comunidade Européia, será impossível não afetar os exportadores para
a Europa, inclusive os de matérias primas brutas ou processadas. É o caso, por exemplo, da discussão, já em estágio
avançado, que vem ocorrendo na Diretoria de Meio Ambiente da Comissão dos Estados Europeus, em Bruxelas, sobre
critérios para atribuição do selo ecológico para produtos fabricados com madeiras tropicais.
Também os efeitos da norma BS 7750 e a certificação de sistemas de gerenciamento ambiental atingirão o Brasil, da mesma
forma como as normas ISO 9000 o fizeram.
Torna-se mister para os exportadores brasileiros de matérias primas brutas ou processadas para a Comunidade Européia, o
perfeito entendimento dos objetivos e das premissas que regem os processos de certificação ambiental naqueles países, e
atuar rapidamente no sentido de se adequar aos princípios dessa Nova Instituição. Caso contrário, o que, à primeira vista
possa parecer apenas mais um “modismo verde”, poderá vir a se constituir em mais urna efetiva barreira alfandegária para os
exportadores brasileiros.
Os primeiros passos estão sendo dados em alguns setores exportadores, como o de papel e celulose, madeiras tropicais e
siderurgia, entre outros.
Modelos para certificação estão sendo discutidos a nível nacional, e com a Comunidade Européia.
Além da pressão dos mercados externos, há também a pressão crescente do mercado nacional como a exigência ‘futura das
empresas do sistema Eletrobrás de compra de cabos de transmissão somente com certificação de sistema de qualidade pelo
padrão ISO, a partir de 1993/94.
Ainda sem um arcabouço institucional consolidado no Brasil o “Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade”, instituído
em 1990, foi o ponto de partida para a sua implementação. O órgão executivo do Sistema Brasileiro de certificação é o
INMETRO, que corresponde ao órgão nacional de credenciamento indicado na figura 1. O órgão correspondente ao EOCT
Europeu será o CBC Comitê Brasileiro de Certificação, cuja criação já está prevista. Ao nível dos organismos certificadores,
somente duas entidades nacionais estão credenciadas junto ao INMETRO, além dos organismos certificadores internacionais
que atuam no Brasil.
Para a consolidação do sistema, ainda é necessária a formação de comitês, o credenciamento de mais entidades
certificadoras, além do estabelecimento da articulação do sistema brasileiro com o europeu.
5. CONCLUSÃO
Certamente uma futura certificação de sistemas de gerenciamento ambiental na Europa tornará como referência a Norma BS
7750. Essa certificação deverá seguir o mesmo curso da certificação da qualidade, que adota como referência as Normas
ISO série 9000, hoje totalmente inseridas nos sistemas de gerenciamento empresarial. A certificação ambiental de sistemas
será imprescindível instrumento para a obtenção do selo ecológico de produtos.
Para vários grupos de produtos existem estudos em estágios avançados para fixação de critérios de concessão do Selo
Ecológico, corno é o caso de papéis e produtos que utilizam madeiras como matéria prima. Outros produtos, corno, por
exemplo aço, notadamente os que empregam carvão vegetal na produção de ferro gusa, serão rapidamente afetados pela
instituição do Selo Ecológico.
A indústria brasileira exportadora para a Europa inevitavelmente terá de se inteirar e, se possível, participar das discussões
ainda em curso sobre o Selo Ecológico.
Num curto espaço de tempo a certificação de sistemas de gerenciamento ambiental e a certificação ambiental de produtos se
constituirão no mecanismo de controle ambiental que atingirá de forma mais contundente o modelo industrial em vigência não
só na Europa, corno e principalmente, nos países produtores de matérias primas.
6. BIBLIOGRAFIA
British Standard Institution, BS 7750 – Specification for Enviornmental Management Systems, Mar/92.
Diário Oficial de las Comunidades Europeas nº L99/1 – Reglamento (CEE) nº 880/92 del Consejo – Bruselas, Mar/92.
Gazeta Mercantil, 10/11/92.
International Standards Organization, Norma ISO 8402 – Quality Vocabulary, Jun/86.
The Joint European Standards Institution:
– EN 45001 – General criteria for the operation of testing laboratories;
– EN 45002 – General criteria for the assessment of testing laboratories;
– EN 45003 – General criteria for laboratory accreditation bodies;
– EN 45011 – General criteria for certification bodies operating product certification;
– EN 45012 – General criteria for certification bodies operating quality system certification;
– EN 45013 – General criteria for certification bodies operating certification of personnel;
– EN 45014 – General criteria for suppliers declaration of conformity.
Quality Management International Limited, Quality Management and the Single European Market (1992 Legislation),
Nov/90.